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sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Abrindo a relação


Ultimamente muitas pessoas vieram me questionar sobre o processo de se abrir uma relação monogâmica. Como passar de uma relação que sempre foi mono para uma sem exclusividade?
Bem, obviamente não existe uma receita pronta para isso e cada casal deve levar em conta as particularidades da sua própria relação para começar a trilhar esse caminho. Contudo, acho que existem algumas questões importantes que podem/devem ser objeto de reflexão para todos que se propõem esse processo, a saber:

- Analisar a real motivação do casal para abrir o relacionamento: se o motivo for "salvar a relação", desaconselho em absoluto, a probabilidade de a relação acabar de vez é muito maior nesse caso. Os obstáculos que encontramos ao nos abrirmos para não monogamia não são simples nem fáceis, o dialogo, o respeito e a compreensão mútua serão essenciais nesse caminho. Se tais características já não fazem parte da relação mono, não faz sentido achar que elas surgirão gratuitamente nesse momento.



- A escolha pela não monogamia precisa ser conjunta e consciente. Se seu/ sua parceire não está disposto a sequer tentar (por motivos próprios e não para agradar você) a não monogamia, não o/a obrigue a esse processo. A relação não se faz sozinha, é uma construção entre duas ou mais pessoas, por isso, todas as decisões relativas à mesma, devem ser tomadas por todes os/as envolvides, o que não quer dizer que a parte interessada na não monogamia deva se conformar em viver de uma maneira que não a satisfaz. Acho justo tentar o convencimento a partir de uma crítica à instituição e à naturalização da monogamia como única opção válida e/ou legítima para se viver o amor e as relações. Um diálogo sincero, respeitoso, que leve em consideração o sentimento do outre, pode surtir um efeito positivo. Se, ainda assim, as partes não chegarem a um consenso, não vejo como continuar essa relação sem que alguém não acabe frustrado, incomodado, subjugado em suas vontades/ necessidades.


- Acordos são necessários. Abrir uma relação não significa deixar de ter "regras" no relacionamento, até decidir não ter acordo já é um acordo que deve ser tomado por ambos. Ter um relacionamento não mono não é deixar de se importar com o/a outre e viver focado em seus desejos e vontades, é entender que, apesar de você amar e querer estar junto ao seu/sua parceire, o desejo e o afeto não são limitados e que viver mais de uma relação não implica negligenciar sua relação primária. Além disso, eu pessoalmente aconselho que os acordos sejam estabelecidos visando identificar os limites das pessoas envolvidas: eu posso aceitar que meu amor tenha um outro amor, mas posso preferir não conhecer ou ter contato com essa nova pessoa, ou então, pelo contrário, eu posso me sentir mais segura se souber quem é, se conhecer; eu posso não ver problemas em meu amor ficar com outras pessoas na minha frente pois entendo que é um exercício de sua liberdade que em nada irá me prejudicar ou eu posso não gostar de que isso aconteça por sentir ciúme ou qualquer outro tipo de incômodo; eu posso preferir ter prioridade com minha relação mais antiga por me sentir mais segura dessa forma ou posso não querer priorizar nenhuma relação por considerar que cada relação tem seu valor e não deve ser equiparada...enfim, as possibilidades de acordos são inúmeras e devem corresponder às necessidades específicas e particulares da relação em questão.


- As possibilidades e regras da relação valem para todos. Infelizmente tenho percebido que, com o aumento da divulgação do poliamor através das diversas mídias, muitos homens têm visto na ideia de um relacionamento não mono a oportunidade de "trair com consentimento". Serei bem clara e direta: se você, homem, quer poder ficar com "todo mundo", mas não concebe que sua parceira tenha essa mesma possibilidade, você não está falando de poliamor, você está usando o nome Poliamor (que é um modo de se relacionar que exige consensualidade e igualdade entre as partes) para exercer seu machismo. O Poliamor, a meu ver, deve servir para empoderar as mulheres em seus relacionamentos, que, via de regra, sempre foram mais favoráveis aos homens e não para submetê-las ainda mais a uma condição de servilismo.

Espero ter contribuído um pouquinho para a reflexão das pessoas que vieram me procurar por conta dessa questão. Se ainda assim, surgirem dúvidas, postem nos comentários que responderei assim que possível. :)